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Larissa Oliveira
Sergipana e professora bilíngue, admira os mais diversos tipos de arte e já teve seu momento Twin Peaks, além de epifania ao ler o romance que dá nome a este blog, A Redoma de Vidro de Sylvia Plath. Este Blog nasceu em 2014 e é dedicado a críticas de filmes, livros, séries e música, sendo que as dos três primeiros contêm spoilers. Boa leitura!

Crítica: Tristana (1970)



Por vários séculos, o destino de uma mulher estaria intrinsecamente ligado a um homem que a sustentasse. O romance espanhol de Benito Pérez Galdós lançado em 1892 desafiava o lugar de submissa e ingênua internalizado à mulher do seu tempo. Ninguém melhor que o diretor Luis Buñuel para adaptá-lo ao cinema, uma vez que ele é renomado por sua crítica à hipocrisia capitalista. Em Esse Obscuro Objeto do Desejo (1977) o diretor também espanhol, retrata no seu estilo inconfundível, a duplicidade que se impõe ao mundo feminino: a de anjo e demônio. A farsa é tão adentrada no imaginário masculino, que quando a mulher decide ser o que quer, o homem encontra-se perdido na sua limitação e na fragilidade de seu ego. Essa é a mesma ideia que Buñuel adota em Tristana, Uma Paixão Mórbida.
Ambientado no lugar de origem do cineasta, a jovem Tristana é adotada pelo nobre Don Lope após perder sua mãe. O cético e imoral aristocrata seduz a indefesa garota, que por sua limitação social, rende-se hesitantemente aos seus desejos e caprichos. Seu duplo papel de filha e dona de casa é inicialmente realizado sem objeções. Porém, à medida que envelhece, Tristana desperta uma paixão pela arte e por aventuras. Uma delas é ao lado do jovem artista Horácio. Declarada dona de si e de suas escolhas, ela foge com o rapaz, mas  é ao lado de um homem que mais uma vez, encontraria-se limitada.


Tristana adquire uma doença que resulta na amputação de uma de suas pernas. Sua concepção de liberdade não é a mesma que se desperta na metade do século XX. Apesar de ser independente nas suas escolhas, as mesmas culminam na dependência financeira de um homem. Sendo assim, a protagonista retorna ao lar opressor de Don Lope e casa-se com ele por desgosto. O paradoxo sexual, outra marca distinta da filmografia de Buñuel, reverte-se ao vermos Tristana tornar-se cada vez mais mórbida e sedutora ao passo que Lope degrada-se em velhice e privado de realizações sexuais. Sua condição física atual simboliza ironicamente a consciência de que ela não mais precisava da companhia de um aristocrata para completar-se. A sua vingança contra o abuso de Don Lope dá-se de forma inconsequente e impiedosa. Não há como negar que a beleza gélida da atriz Catherine Deneuve se encaixa perfeitamente no papel de Tristana, sendo ela uma mistura de suas personagens em A Sereia do Mississipi (1969) e A Bela da Tarde (1967) — este sendo outra contribuição com Luis Buñuel.
O sopro de sua maldade revela-se através de um sonho sádico sobre Lope e o atinge fatalmente. O anjo vingador que Tristana se torna não retirou sua posição inicial de vítima visto que era a sua única forma possível de eliminar os contornos que a delimitavam. 
O longa pode não ser o mais admirado entre os fãs do diretor, porém, contém todos os elementos da filmografia de Buñuel que o torna inconfundível e irresistível.








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